Pancreatite Crônica

Autores: Andréa Tosta de Oliveira Santana1, Dr. 2

1-Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Medicina
2-

 

O que é?

Trata-se da inflamação progressiva e constante do pâncreas, órgão que se localiza no abdome e é responsável pela secreção de substâncias necessárias para a digestão dos alimentos, bem como pelo controle das taxas de açúcar no sangue por meio da secreção de hormônios, dentre eles a insulina. Essa inflamação leva a alterações na estrutura do pâncreas, o que altera de forma definitiva a sua função, que se torna deficiente.


Como acontece?

A pancreatite crônica pode ter diversas causas, quais sejam:

  1. Uso abusivo de álcool, sendo esta a principal causa em nosso meio, correspondendo a mais de 70% dos casos de pancreatite crônica;

  2. Causas genéticas (pancreatite hereditária, fibrose cística);

  3. Obstrução de ductos pancreáticos que drenam as suas secreções por trauma, pseudocisto, “pedras”, tumores, distribuição anormal dos ductos do pâncreas (pancreas divisum);

  4. Presença de doenças sistêmicas, como lúpus eritematoso sistêmico, excesso de triglicerídeos ou hiperparatireoidismo;

  5. Pancreatite auto-imune, em que o próprio organismo atua contra o pâncreas;

  6. Pancreatite idiopática, ou seja, sem causa conhecida.


O que se sente?

Os principais sintomas da pancreatite crônica são: dor abdominal e aqueles decorrentes da função deficiente do órgão, a insuficiência pancreática.

A dor abdominal localiza-se principalmente na região do estômago, mas pode estender-se até as costas e ser acompanhada por vômitos e náusea. Por vezes, há alívio da dor quando o paciente senta-se ou curva-se para frente. Sua frequência é maior no período após a alimentação. No início da doença, pode surgir em crises, embora, com o decorrer do tempo, tenda a se tornar contínua. Em certas situações, pode ser debilitante e acompanhada de perda de peso. Contudo, há casos de pacientes portadores de pancreatite crônica que não apresentam quadro de dor abdominal.

A insuficiência pancreática representa a redução da função do pâncreas, que passa a secretar as enzimas digestivas e hormônios em quantidades insuficientes para atender às exigências do organismo. Ela manifesta-se especialmente através da má-absorção de nutrientes como proteínas e gorduras, gerando perda de peso, e pela ocorrência de diabetes. Essa insuficiência, porém, geralmente não surge logo no início da doença, aparecendo quando o pâncreas já se encontra bastante lesado.

A má-absorção de gorduras pode causar diarréia e aparecimento de gordura nas fezes, o que se chama esteatorréia, sendo que as fezes tornam-se oleosas, brilhantes, com odor fétido e tendem a boiar no vaso sanitário.

O diabetes normalmente surge já em fases mais avançadas da doença, podendo haver, no início, apenas uma intolerância à glicose. Esse tipo de diabetes quase sempre exige a utilização de insulina, sendo de difícil controle.


Evolução

Em razão da inflamação constante do pâncreas e das alterações em sua estrutura, podem surgir complicações, algumas delas graves e que exigem rápida intervenção médica. Tais complicações são:

  1. Formação de estruturas semelhantes a cistos dentro e em torno do pâncreas;

  2. Obstrução dos ductos que drenam a vesícula biliar e o pâncreas, podendo, então, ocorrer icterícia (pele e mucosas amareladas);

  3. Acúmulo de líquido na cavidade abdominal (ascite pancreática) ou torácica (efusão pleural);

  4. Formação de coágulos em veias próximas ao pâncreas, como veia porta e veia esplênica, podendo culminar em hemorragia digestiva;

  5. Formação de pseudoaneurisma;

  6. Ocorrência de episódios de pancreatite aguda (colocar link para a pancreatite aguda), principalmente após ingestão de álcool ou de alimentos ricos em gordura;

  7. Aumento do risco de desenvolvimento de câncer de pâncreas.


Diagnóstico

O diagnóstico deve se basear na história clínica, exame físico, exames de imagem e de laboratório.

Exames de sangue podem detectar um aumento das enzimas produzidas pelo pâncreas (amilase e lipase), que são liberadas na circulação devido à lesão às células do órgão. Contudo, ao contrário da pancreatite aguda, em que tais enzimas geralmente estão elevadas, no caso da pancreatite crônica, as mesmas podem estar dentro dos níveis normais, não se tratando, portanto, de exames conclusivos para o diagnóstico. Em razão disso, mostra-se necessária a realização de exames de imagem.

Dentro dos exames de imagem, podem ser realizados raio-x, ultrassonografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética de abdome, através dos quais sejam visualizados edema, calcificações no pâncreas ou obstruções/dilatações no ducto pancreático principal ou de seus ramos. Pode-se realizar ainda uma CPRE (colangiopancreatografia retrógrada endoscópica) ou colangioressonância. Atualmente, o principal exame que vem sendo utilizado é a tomografia computadorizada. Tais exames possibilitam a análise do grau de lesão ao pâncreas, presença de “pedras” nos ductos e eventuais complicações.

Deve-se atentar, entretanto, que pode se tratar de um caso de pancreatite crônica ainda que não haja alterações nos exames de imagem realizados, nos casos em que a doença está apenas se iniciando, quando ainda não há alterações no órgão que sejam detectáveis por meio dos exames disponíveis. Nessas hipóteses, o diagnóstico requer a realização de exames a fim de apurar a função pancreática, seja através da quantificação da secreção do pâncreas após certo estímulo, seja através da análise de evidências de má função pancreática, como presença de gordura ou elastase nas fezes (esteatorréia) e/ou diabetes. Os resultados desses testes devem ser avaliados tendo-se em vista os sintomas apresentados pelo paciente.


Tratamento

Os principais objetivos do tratamento da pancreatite crônica são: a) alívio da dor; b) correção da insuficiência pancreática; c) manejo de eventuais complicações que venham a ocorrer.

  1. Alívio da dor – este pode ser obtido através da adoção de algumas mudanças nos hábitos de vida dos pacientes, tais como: interrupção da ingestão de bebidas alcoólicas, principalmente nos casos de pancreatite crônica induzida por álcool; ingestão de porções menores de alimentos durante as refeições, devendo-se evitar alimentos gordurosos. Além disso, pode haver a reposição das enzimas pancreáticas, que não vêm sendo produzidas em quantidades adequadas em razão da doença. Havendo persistência da dor apesar da utilização dos meios já citados, pode ser necessária a utilização de analgésicos para o seu alívio e, em casos mais graves, os pacientes podem ser encaminhados a centros especializados a fim de serem submetidos a procedimentos invasivos, que podem incluir bloqueios de nervos, terapia por meio de endoscopia ou até mesmo cirurgia;

  1. Correção da insuficiência pancreática – essa correção é realizada tanto através da reposição das enzimas pancreáticas que não vêm sendo adequadamente produzidas pelo pâncreas doente quanto através de alterações na dieta do paciente, que deve reduzir a ingestão de gorduras. Com isso, controla-se a má-absorção de nutrientes que é observada nos pacientes portadores de pancreatite crônica. Além disso, tal reposição pode, em alguns casos, auxiliar no alívio e controle da dor abdominal.

  1. Manejo de eventuais complicações – nestes casos, cada complicação tem um tratamento específico.


Prevenção

Uma vez que em nosso meio mais de 70% dos casos de pancreatite crônica decorrem do uso abusivo de álcool, uma forma de preveni-la é a ingestão moderada de tal produto.

 

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